As jornalistas Cristiane Damaceno e Maria Júlia, a “Maju”,
e as atrizes Thaís Araújo e Sheron Menezes, além de serem mulheres e negras,
têm mais fatos que as ligam como personagens marcantes desse ano de 2015. O que
conecta essas 4 mulheres e outras muitas anônimas no Brasil é o fato de que
todas foram vítimas de racismo.
Alexandra Loras,
que não é tão conhecida do público brasileiro quanto às mulheres acima, mas
mesmo assim ela tem muito a dizer sobre esse tema. Alexandra é uma jornalista
francesa de 38 anos, graduada pela mais respeitada escola de ciências políticas
da França, a Sciense Po. Casada com Damien Loras, cônsul geral da França no
Brasil, ela reside na capital paulistana há três anos, em recente entrevista a
Revista Istoé, (N° Edição: 2400 /27.Nov.15) a senhora Loras, afirma
peremptoriamente que “O Brasil é um dos países mais racistas do mundo”.
A consulesa fala com a propriedade de uma mulher que já viajou por mais
de 50 países e que já morou em pelo menos 8, ou seja Loras, sabe, ou melhor já sentiu na
pela e na alma o racismo à brasileira. O mesmo que sofreram, sofrem e sofrerão
Thaíses, Sherons, Majus, Cristianes, Raíssas, Cíntias, Lidianes e Alexandras. O
racismo à brasileira que de uma população 57 % de negros/as coloca apenas 4%
nas telas das TVs. Racismo à brasileira que leva a invisibilidade negros/as nas
escolas, nos ambientes de trabalho e nos círculos de poder.
Onde estão @s negr@s brasileir@s? Quantos somos nas
universidades? Nas Câmaras Legislativas? Nas Assembleias? Nos Tribunais de
Justiça? Nas prefeituras? Governos? Nos secretariados? Nós ministérios? Os
números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas divulgaram por meio
da Síntese de Indicadores Sociais (SIS) uma análise das condições de vida da
população brasileira em 2015, no último dia 04 de dezembro, que evidencia que
algo vem sendo feito nos últimos anos no país, porém há ainda um abismo que
separa negr@s e branc@s no Brasil.
E
o fosso que separa os negros e brancos é pior ainda quando se faz um recorte de
gênero. Se os homens negros jovens são as principais vitimas da violência tanto
institucionalizada por meio das forças de repressão do estado, quanto por meio
social, são as mulheres negras as principais vítimas do racismo relacionado à
estética. Racismo este que destrói e mutila a autoestima dessas negras. E
levam-nas a buscarem um processo de embranquecimento que vai desde o alisamento
do cabelo que chegam até ao pasmem, produtos de beleza que prometem o
clareamento da pele.
A pesquisa com as bonecas mostra que o buraco é mais embaixo:
85% das crianças negras escolhem a boneca branca como a boazinha e a negra como
a má e feia. Tudo isso é fruto de uma ideologia que veicula nos meios de
comunicação, nas novelas, seriados, em todos os cantos a supremacia de um
fenótipo branco como “padrão de beleza”.
Mas e as mulheres negras o
que sobra? No período da colheita do
café, que geralmente começava no mês das “noivas”, Maio. Nesses períodos os
dias são bem longos e penosos. É inverno ainda, contudo um inverno dos
trópicos, com seu sol a flambar nas dez horas de faina, transformando a terra
em fornalha. Nessas horas as negras, queimavam ao sol, nas lavouras da
plantations. As mãos suaves eram as escolhida para colherem o algodão. Além da
lida no campo, elas eram responsáveis por inúmeras obrigações tanto físicas
como sexuais.
É evidente que esse olhar da mulher negra como “pau para
toda obra”, distancia-se da visão idílica de mulher como sexo frágil. Mesmo
antes de o movimento feminista reivindicar o direito ao trabalho, as mulheres
negras já ocupavam as lavouras e posteriormente as fábricas. Toda essa carga
racista, machista e preconceituosa de outrora evidencia a atual situação das
mulheres negras brasileiras. Queríamos que esse retrato da sociedade fosse uma
fotografia do século XIX, queríamos, porém não o é. A ideologia dominante
edificou o imaginário que relacionou a negra ao prazer sexual do branco,
reconhecendo e fazendo recair em seu corpo o arquétipo da escrava e
coisificação sexual, gerando a inveja das senhoras brancas.
As
mutilações, extirpações, deformações e outras atrocidades praticadas pelas
senhoras brancas no corpo das negras, das quais abundam exemplos na literatura
da época, buscavam afetar regiões corporais comumente identificadas com o poder
da sedução. Hoje as descendentes das sinhás atacam as negras não mais no
castigo físico, na mutilação, mas sim na autoestima, no cabelo, na cor de
ébano, naquilo em que as negras que se posicionam na sociedade mais prezam: sua
identidade, sua negritude. Até quando?
A
pergunta que fecha a entrevista de Alexandra Loras merece transcrição literal.
Revista Istoé: O Brasil sabe que é um dos países mais racista do mundo?
Alexandra: Não sabe e nem quer escutar isto. O Brasil é o país do otimismo, do
samba, do carnaval, da natureza, dessa felicidade e da informalidade. É uma
narrativa do estrangeiro. Na elite, as pessoas nem querem debater sobre isso,
porque esse assunto incomoda. Mas, em dois anos de manifestações e tudo o que
tem acontecido no país, sinto que o brasileiro é como um jovem adolescente
rebelde. Ele hoje quer protestar, escutar e refletir.
Então
vamos refletir, afinal, O Brasil é um dos países mais racista do mundo? Fonte:
Pragmatismo Político.