Autor da denúncia que originou a
operação da Polícia Federal no Senado na sexta-feira passada, o policial
legislativo Paulo Igor Bosco Silva afirmou que seus colegas cumpriram uma
missão "secreta" no escritório particular do ex-presidente da Casa
José Sarney (PMDB-AP), em Brasília. O objetivo, como em outros pedidos feitos
pelos parlamentares, era descobrir se o local estava grampeado por eventuais
escutas ambientais e telefônicas.
Silva recebeu o Estado na
tarde de sábado e detalhou a denúncia apresentada ao Ministério Público Federal
e à Polícia Federal. A varredura de grampos realizada no escritório de Sarney,
de acordo com ele, foi feita por meio de uma "ordem de missão
oculta", não numerada, em julho de 2015, quando o ex-parlamentar não
exercia mais cargo público.
"Muitas vezes a emissão de
ordem de missão vinha não numerada. Uma ordem de missão não numerada é aquela
que está inscrita no papel, mas não entra no controle. Tem a ordem 1,2,3,4, 5
e, a partir do momento que emito uma sem numeração, significa que ela não está
entrando no controle. Isso aconteceu na do Sarney", afirmou Silva.
"Ordem de missão não numerada não é normal porque todo documento oficial
tem que ter um controle do órgão", completou.
Afastado das atividades por
motivos de saúde, Silva, de 29 anos e há quatro funcionário concursado da
Polícia Legislativa, diz que fez a denúncia após suspeitar que as ações de
varreduras tinham como objetivo embaraçar as investigações da PF no âmbito da
Operação Lava Jato. Ele nega relação com o fato de estar respondendo a um
procedimento interno sob a acusação de dar aulas em um cursinho em horário de
expediente. "Não tem fundamento, porque a denúncia que fiz foi de maio e a
sindicância é de 31 de agosto."
Desdobramentos das investigações
da PF apontam que um grupo de policiais legislativos, liderado pelo diretor da
Polícia do Senado, Pedro Ricardo Araújo Carvalho, "tinha a finalidade de
criar embaraços às ações investigativas da PF para favorecer senadores e
ex-senadores, utilizando-se de equipamentos de inteligência". Entre os
beneficiados também foram citados os senadores Fernando Collor (PTC-AL) e
Gleisi Hofmann (PT-PR), além do ex-senador Lobão Filho (PMDB-MA).
Carvalho e mais três policiais
legislativos foram presos pela PF, mas apenas o diretor continua detido. Em
nota divulgada na sexta-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros
(PMDB-AL), defendeu a atuação dos policiais subordinados a ele e afirmou que as
varreduras não acarretam em outros tipos de monitoramento.
Lava Jato. Silva relatou também uma ordem de
"missão não numerada" nos escritórios particulares de Lobão Filho no
Maranhão. Na ocasião, porém, houve resistência por parte dos agentes do Senado
destacados para a operação.
"Como era algo que causava
estranheza, o pessoal acabou entendendo, por bem, que não seria cumprido se não
tivesse a ordem por escrito. E foi feito, apareceu a ordem por escrito e eles
foram cumprir. Mas eu me recusei", afirmou.
Segundo ele, a recusa ocorreu
após notar uma associação do pedido de varredura com uma ação da Lava Jato.
"A PF fez uma operação que envolveu o Lobão e pouco tempo depois foi
determinado uma varredura nos escritórios particulares e na residência lá no
Maranhão."
A mesma iniciativa teria ocorrido
após batida da PF nas residências do senador Fernando Collor (PTC-AL),
realizadas em 15 de julho, em Brasília. "Assim que a Polícia Federal saiu
da Casa da Dinda, o pessoal entrou para fazer a varredura. Assim que saíram do
apartamento funcional dele, o mesmo procedimento foi feito" disse Igor.
"Isso me causava estranheza.
Se a Operação Lava Jato estava com a autorização judicial e a PF cumpriu uma
decisão também com autorização, como é que eu vou, na sequência, no mesmo
endereço, fazer uma operação de contrainteligência verificando se existe ou não
o grampo? Você pode até me falar: mas o grampo não poderia ser externo, de
outro lugar? Poderia, mas também poderia ser da PF. E obviamente não vou saber
identificar qual é qual, encontrando um, vou tirá-lo. E evidentemente que isso
poderia atrapalhar o andamento das investigações."
O policial legislativo afirmou
desconhecer de quem partiam as ordens para as missões. "É a dúvida que
surge, mas eu também não posso tirá-la. Desconheço se havia alguma determinação
superior, alguma combinação. Para cima não sei o que acontecia, sei o que
acontecia do Pedro (diretor da Polícia Legislativa) para baixo."
Ele revelou ainda que, após a
operação de sexta, foi ameaçado por um agente próximo do diretor da Polícia
Legislativa. Em um grupo de mensagens utilizado pelos policiais, ele escreveu
que "após resolverem tudo isso (prisão de Carvalho), deveriam
resolveu o destino dele".
Defesa. Procurado pelo Estado, o
advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende Sarney, afirmou
que o ex-senador não se lembra da varredura em seu escritório. "Se foi
feito depois, ele, como presidente do Senado, pode até discutir se houve alguma
questão administrativa, alguma falha. Mas jamais se cometeu um crime",
disse Kakay.
O advogado-geral do Senado, Alberto
Cascais, foi procurado ontem, mas não respondeu aos telefonemas até o
fechamento desta edição. Fonte: Notícias ao Minuto.