Por Tereza
Cruvinel (Colunista do
247 e jornalista política do País).
Os golpes do passado
aconteciam na calada da noite e surpreendiam o pais. Agora estamos na iminência
da deposição legalizada da presidente eleita e um país cansado da crise na
elite política conta as horas que faltam para o desfecho. Parlamentares e ministros
do PT denunciam a guerra psicológica para criar o efeito manada entre as
bancadas e asseguram ter cerca de 200 votos para barrar o impeachment. O outro
lado diz ter votos de sobra. Ninguém sabe ao certo. Mais de cem deputados se
ocultam na condição de “indecisos” para se livrar das pressões e pular no barco
vencedor. Estes são os que não suportam viver fora de um governo, qualquer
governo. Seja qual for o resultado, o Brasil não vai ao paraíso. Pelo
contrário. Tempos mais amargos podem vir.
Nada indica que um dos lados
vai ganhar de lavada como em 1992, quando havia o quase consenso contra Collor.
O país continuará cindido no eventual governo biônico de Michel Temer e a
bronca do anti-petismo dará lugar ao ressentimento das esquerdas, dos movimentos
sociais, dos que resistiram ao rompimento com a vontade popular.
Haverá uma “visita da saúde”
na economia, com bolsa subindo e dólar caindo no momento imediato. Já os
problemas estruturais não serão resolvidos com a eventual remoção de
Dilma Rousseff do Planalto. Logo depois, quando começarem os sacrifícios
anunciados por Temer, as ruas ferverão contra ele. Aliás, quem vai ferver é a
Esplanada, logo depois de anunciado o resultado de domingo. O perigo mora ali,
no espaço separado pelo muro da intolerância.
É lorota dizer que tudo vai
melhorar já no domingo, se o golpe triunfar, como estão a dizer tantos
arautos do oportunismo na tribuna na Câmara. Não é verdade que as instituições
sairão fortalecidas. Sairão esfarrapadas. O recurso a um impeachment sem base
jurídica consistente é prova de que o sistema político não tem capacidade para
enfrentar crises. Será preciso consertá-lo mas, quem se dispõe? As
regras da convivência democrática estão rotas. Não será o governo de Temer,
carimbado como golpista e traidor, que conseguirá a superação da polaridade.
O PMDB, que sem votos para
eleger um presidente se locupletou nos governos de todos os que se elegeram a
partir de 1989, agora se prepara para dominar sozinho as arcas do poder.
O PSDB não dá o braço a torcer
mas não era este o seu plano de vingança contra a derrota de 2014. O que
buscou foi uma nova eleição que lhe devolvesse a chance perdida com Aécio
Neves. Acabou porém tornando-se força auxiliar da engrenagem montada por Cunha
e Temer. Passando o impeachment, terá que ajudar a sustentar um eventual
governo Temer. Se não sobrevier o caos, Temer será candidato à reeleição,
reduzindo as chances de vitória dos tucanos. Sobrevindo os tempos amargos que
parecem inescapáveis, será sócio de um governo impopular.
Os partidos médios que estão
desembarcando do governo serão os mais desiludidos. Não haverá espaço para eles
num governo que terá de contentar todas as correntes e apetites do PMDB, além
dos “notáveis” que Temer fala em nomear.
E, por fim, os indignados com
a corrupção que se preparam. A Lava Jato sairá aos poucos de cena, alguns
petistas ficarão na cadeia e a vida seguirá. Terão se salvado todos os
denunciados e delatados, especialmente os do PMDB. Quando a turma
que xinga Lula de ladrão na Paulista perceber, a página já virou.
Falando em PMDB, é infinita a
lista dos que não têm mesmo nenhum pudor ou constrangimento na incoerência. Mas
o filho de Sergio Cabral, o governador que Lula mais ajudou, votar a favor do
impeachment é realmente um emblema do pragmatismo na política.
Daqui até domingo, e
especialmente no domingo, a miséria da política vai se revelar em toda a sua
extensão. Ela se revela nestas horas, na certeza de que o acessório ofuscará o
essencial. Fonte: Brasil 247.